domingo, 7 de abril de 2013

UM ARTIGO - SAUDADE! POR EDNALDO BEZERRA


Novamente eu estava lá, na Seção de Cobrança da agência Recife-Centro, do Banco do Nordeste, no fim dos anos setenta, início dos anos oitenta. Humberto somava um maço de títulos descontados, numa máquina Olivetti, a bobina saía lentamente. Ele não somava tão rápido quanto o Marcos Antístenes. De vez em quando, parava o dedo médio e o movimentava de um lado para o outro na tecla do número cinco; talvez para confirmar que os dedos estavam na posição correta, pois na referida tecla havia uma pequena saliência. Mas, na verdade, nunca o perguntei o motivo desse cacoete. Humberto, na flor da idade, já ia ser pai. Éramos todos adolescentes. Maria das Vitórias e Simone faziam conferências em uns relatórios; Carlos, mais conhecido por Coelhinho, retirava os títulos liquidados de um arquivo de metal, cinza, enorme, cheio de gavetas (quando ninguém mais conseguia localizar um documento no arquivo, era só chamá-lo que ele o encontrava – parecia adivinhar, conversar com os papéis), Rubens não parava um minuto sequer, sempre ocupado; Ronaldo e Jamenson, pela segunda vez, passaram vinte minutos no lanche, seu Moacir olhou-os atravessado, devido ao atraso de cinco minutos.

Um dia cheguei meia hora mais cedo, não havia ninguém da turma na frente do Banco, como de costume. Olhei para a pracinha do Diário e vi um grupo vestido igual a mim –  camisa branca quadriculada de azul e vermelho e calça azul-marinho. Eram CHBistas (assim chamados os que faziam o CHB – Curso de Habilitação Bancária. 

A propósito, nessa época era uma dureza danada, foram dois anos e meio de muito empenho e dedicação: de manhã tínhamos aulas das 8:00 às 10:00h, de matemática, português e diversas matérias relacionadas à atividade bancária; à tarde, trabalhávamos de 12:00 às 18:00h, em vários setores do Banco, fazendo rodízios ao longo do curso; à noite íamos ao colégio, dando continuidade aos nossos estudos regulares.

Porém, o esforço valeu a pena, não só pelo aprendizado, mas devido às amizades e às boas recordações que perduram até hoje. Portanto, orgulho-me de pertencer a V turma do CHB-Recife). Pois bem, caminhei até lá onde eles estavam reunidos; quando cheguei, Adauto contava que John Lennon havia sido assassinado...

Também me vi andando pelas ruas do Recife, saindo do colégio 2001 na rua do Riachuelo e indo pegar o ônibus na Dantas Barreto, às dez horas da noite, cansado. Felizmente o Setúbal ainda estava lá, parado. Consegui pegar um lugar sentado à janela; Marcelo Alexandre também se sentou no banco à minha frente. Aos poucos o ônibus ia enchendo. Olhei para um sobrado antigo – embaixo, o comércio fechado; em cima, uma janela com luz negra – a silhueta de uma mulher apareceu e se sobressaía no azul-arroxeado do ambiente, uma prostituta, talvez. A imagem era sedutora, vinham-me fantasias... Como seria deitar com uma mulher? Quando isso aconteceria?...

 As pessoas se espremiam dentro do ônibus, quem estava sentado ajudava os que estavam em pé, segurando-lhes as bolsas, as sacolas, as mochilas, os cadernos. Um vento gostoso acariciou-me o rosto, o movimento do ônibus refrescava-me; sempre gostei de passar no Cais José Estelita. Quando chegar em casa, tomo um banho morno; o que será que mamãe preparou para eu jantar? Papa de aveia, sopa de feijão, inhame, ovos, cuscuz, macaxeira com charque, café com leite...

De repente, acordei sobressaltado, angustiado; levantei-me e fui beber água na cozinha. Olhei para o visor do forno micro ondas, 1:12h, passou da meia noite, já é dia 30 de março de 2013. Por que sonhei com todas essas coisas? Ontem olhava a lua cheia com meu filho, abracei-o e disse que o amava. Também te amo papai – respondeu-me, beijou-me a face direita e depois foi dormir. Fiquei ali, sozinho, olhando da janela para aquela bola prateada no céu, fascinado. Parecia querer me dizer alguma coisa, algo misterioso.

Senti-me pequeno, muito pequeno, e Deus estava lá, no universo e comigo, onipresente. Cedo, o sono chegou. Adormeci. Acordei, angustiado mesmo, com um nó na garganta, uma saudade, um aperto no coração, os olhos cheios d’água. Mas, saudade de quê? Saudade de mim mesmo, talvez. Da vida que se foi. Oh! Como tudo é fugaz, como o tempo passa rápido, é uma faísca, um sopro na eternidade. E como somos insignificantes. Sim, insignificantes. Dói ter consciência de tudo isso...

Ednaldo Bezerra é estudante de Licenciatura em Letras da UFPE

3 comentários:

  1. Gostei da narrativa.Mas quem é Ednaldo Bezerra em Triunfo, filho de qual família?

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    1. Parabenizo Ednaldo pelo artigo escrito com a sensibilidade de um recifense conhecedor dos nossos problemas diários.

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  2. Faz um tempinho que saí daí e não tenho certeza, mas acho deve ser família de Joselaide Bezerra de Vasconcelos.

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